domingo, 13 de janeiro de 2013

Querida, I



13 de Janeiro de 2013
Querida,

E eu desacreditei que em algum dia, ensolarado ou de chuva, você estaria lavando a enorme pilha de louça na cozinha da sua casa com aquela pose de dona de casa que pesa sua idade em uns três ou quatro anos a mais. Com seus cabelos presos em rabo-de-cavalo e ouvindo as canções avulsas da rádio AM que força você a cantar fora do tom com a mais desafinada das vozes. Enquanto cantarolava a música mais tocada do Cazuza - Codinome Beija-Flor - você, vez e outra, disfarçaria a esponja em forma de microfone e berrava alegremente aquela parte do refrão que você adora tanto, e assobiaria nas curtas partes não cantatas acompanhando o solo da guitarra. Então sua mãe iria girar grosseiramente o botão gordo e empoeirado o mais que se pode no sentido anti-horário, crente que abaixaria o volume para poder gritar mais alto contigo e deprimir o seu já triste serviço doméstico. Ela volveria o botão errado, corrupiaria o botão que determinaria a frequência das estações e isso faria a agulha da sua antiga radiola pousar no refrão de uma melodia de um grupo de pagode, o nosso hino. E de repente você teria a porra de uma epifania feminina. Como se seu amor fosse um interruptor e que você não clareasse os cômodos da minha paz não por falta de vontade, mas porque ainda estava procurando o maldito botão no meio de uma sala sombria, tateando no escuro tentando desesperadamente acender essa luz, essa luz no fim do túnel. E então eu veria você vir correndo de volta pro meu perfume doce, meus olhos claros e meu nariz grande. Dizendo que me ainda me ama e que adorou o fato de eu escrever sobre o nosso amor três vezes mais do que o protagonista daquele filme romântico que a gente assistiu, pela metade, pois sempre tínhamos um beijo ou uma transa que não poderia ficar pra depois. E ainda mais; que você admirou tanto por existir algo assim tão forte entre dois personagens da vida real. Eu finalmente desacreditei disso tudo.

Araujo, Rodrigo.

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