domingo, 17 de janeiro de 2016

Pingo de colírio



Em uma festa, um bocejo.

 - Tudo que vai, volta.

Ela disse isso em um tom de revolta vitoriosa, porém cansado. Ela era a senhora eu-não-te-avisei-que-não-ia-dar-certo-porra? Não havia alegria em suas palavras, embora ela tivesse acertado na mosca: eu não estava feliz.

um pingo de colírio: satisfeito por acertar, e incomodado por arder.

Reencontro confuso. Ali ainda havia muito amor. E ainda lembro o cheirinho do seu sabonete quando ela me abraçou com os cabelos ainda molhados, encaracolados e gritando sua naturalidade encantadora. Lembrei também de outra coisa: nosso relacionamento havia acabado há muito tempo. Eu nunca a tirei dos meus pensamentos.

e quem se lembra dos nomes de navios que nunca afundaram?

E isso a despertou de um sono leve, sei disso porque ela mantinha a boca entreaberta e enrolava seus cabelos com o dedo indicador direito. Eu amava seus gestos e decorava cada um deles. Seu corpo moreno e magrela, seus cabelos enegrecidos artificialmente, seu olhar "medusiástico", sua língua vermelho-ocre. Que saudade do seu beijo.

seu corpo é 85% de água, e eu estou com muita sede.

A frase flutuando pelo eco do abismo que havia entre nós dois.

"Tudo que vai, volta."

Só consegui responder:

- Mentira, você nunca voltou para mim!