domingo, 26 de maio de 2013

Seu beijo, seu riso.



Você mergulhou sua boca no protetor labial para escudar sua fenda de palavras, macias e sábias, dos raios do sol e do clima semi-árido de Brasília. E eu desejei ser sua banha-de-cacau por alguns segundos só para poder passear com seu sorriso por aí, por algum bairro florido ou apenas arrodear sua rua com passos lentos e preguiçosos em uma noite enluarada e morna, limpando as sandálias em raras poças de águas, límpidas e correntes, que nasciam das mangueiras de vizinhos que lavavam seus carros populares no dia anterior, e que morriam dentro de algum boeiro gordo. Lembrei do seu beijo. Te beijar era como morder um pão em um dia de fome, era como beber um vinho de safra ruim, em um dia festivo. Que saudade do seu beijo! Eu costumava encher meu travesseiro com nuvens do céu da sua boca e depois tentar sonhar, a noite inteira, com aquelas frases de novela que sempre acaba em cama. Bem, hoje mendigo um pouco do batom do seu beijo trôpego e desesperado, manchando de leve o meu colarinho amarrotado. Com suas mãos escorregando pela minha barba por fazer e seus olhos bem fechados. E depois apenas gozar, olhar você morrendo com aquele sorriso largo, e por mais que você tente esconder o aparelho de seus dentes, acaba ficando impossível pois existe um carimbo de satisfação que sempre moldura seu rosto após você dar um beijo longo e apaixonado especialmente seu; Então, você, satisfeita, sorri de orelha a orelha como uma assinatura própria, sua rubrica pessoal. E eu ainda amo isso. Amo a ideia de não estar só beijando sua boca, seu protetor labial ou o seu batom, mas também de estar beijando o seu riso.

sábado, 25 de maio de 2013

Meia-dúzia ou seis.



Sua saia roxa e sua blusa colada, sem passar e com marcas de cabide, embrulham seu sensualismo de mulher e seu desleixo de adolescente numa pessoa só. Consigo visualizar você, mentalmente, com uma postura ereta e seu pequeno braço direito segurando de mansinho o esquerdo, no alto do cotovelo, criando uma barreira que poucos homens conseguem driblar. O fato de você viver abraçando a si mesma me passa uma mensagem subliminar de carência e, ao mesmo tempo, de desafio. O jeito que você me olha, sempre de baixo para cima, me sugestiona a cuidar de você. Aquele olhar, carente e decidido, imobiliza minha malícia e tudo o que eu consigo sentir é uma compromisso em ser o seu redentor, em te fazer feliz. Como se você fosse quebrável, de vidro. E até um beijo que eu te roubo, eu tenho que pedir licença e por favor. É como andar em uma piscina de gelo. Se você fosse uma caixa estaria estampado pelo fabricante - "Cuidado! Muito, muito frágil." E assim você enganou o desvirginador da sua alma e todos os garotos que seguraram sua nanica mão ao atravessar a rua. Eu enxerguei além da tautologia da sua delicada e vulnerável alma feminina, e do clichê do sexo frágil. Eu vi você como uma Quimera, reservada e pronta para atacar. Da cintura pra baixo uma mulher com curvas de rio, moldadas para o samba. Da cintura pra cima um rosto juvenil e dócil, uma pele macia e um sorriso curto. E dentro, um coração calejado em banho-maria, pronto para dançar uma música lenta de rosto colado ou para pular carnaval durante todo o mês de fevereiro. Olhando a interrogação na linha pontilhada do seu pensamento eu me pego implorando para você dar apenas o primeiro passo em minha direção, porque o resto do caminho eu te carregaria no meu colo. Como se você fosse minha casa e independente da porta, eu entraria no mesmo cômodo. E entre tantos números, eu me pego confuso e desalinhado, tentado a escolher entre meia-dúzia ou seis - em outras palavras: Ou você fica comigo, ou eu fico com você

quarta-feira, 22 de maio de 2013

Ampulheta



Você limpou o suor da testa com as costas da mão e gemeu bem alto. E tudo o que você queria, naquele momento, era ser amada de verdade por alguém que não fosse você mesma. De repente você não tinha pressa e não se sentia atrasada para nenhum sentimento cru, mal-passado ou no ponto. Você simplesmente o devorava. E isso te fez engolir a semente da vida, e da ambiguidade.

Seu lindo corpo mudou depois de germinar o bendito fruto por nove meses e isso assustou você. Sua insegurança era tanta que agora você conta de cinco em cinco até para falar as horas corretamente em um relógio analógico, onde os ponteiros dos minutos são marcados apenas por alguns ilegíveis riscos. Isso porque algum designer influente disse que seria legal brincar com a sua capacidade de adivinhar a precisão do horário de uma forma mais difícil. Algumas estrias aqui, outras ali. Aposto que isso influenciou você a apagar a luz durante o sexo, pois ao fim das contas você acabaria vinculando qualquer olhar mais dedicado com um caçador de defeitos ou com algum jurado sobre o corpo fitness. Acho que você deveria parar de comprar aquelas revistas com mãe famosas estampadas nas capas e que ensina como se viver bem.

Mas isso acaba quando  primeiro choramingo vindo do berço azul-bebê, ao lado da cômoda que não combina com o resto dos móveis, chegar bem alto no seu ouvido. E então você acorda e percebe que não ama o homem que dorme ao seu lado todas as noites. Triste, você põe seus pés descalços no chão frio e caminha até a oca do seu neném. A alegria começa a te abraçar timidamente e quando você olha seu filho brincando com o móbile do berço com seus pequenos pezinhos, você consegue tocar a felicidade de uma vida que você odeia. Não demorou muito para você se divorciar de um sentimento que não existia. Você cansou de enganar sua felicidade para iludir a sociedade e si própria.

E isso mostra que, agora, você está mais interessada em amar do que ser amada. Em outras palavras - você trocou seu relógio analógico por algum mais fácil de ler as horas, um digital. Isso deu um nó em sua cautela e em sua segurança, fazendo elas andarem juntinhas, ao lado da sua vontade de não querer saber que horas são.

domingo, 19 de maio de 2013

Querida, IV





20 de Maio de 2013.
Querida,


Vi você você amadurecer rápido agarrada nos meus frágeis galhos. Vi seu quadril alargar e seus seios esticarem. Seu busto e bunda aumentaram conforme o tamanho da sua saia ia diminuindo gradualmente, e isso me assustou um pouco. Sua maturidade exagerada fez você cair da árvore, dando a oportunidade e sorte, para qualquer um que passasse por ali com um pouco de conversa fiada e um penteado maneiro pegar e te carregar consigo pelo resto da vida. E O embaraço das lágrimas não me permitiram enxergar mais nada depois disso.

Araújo, Rodrigo.

sexta-feira, 17 de maio de 2013

João de Barro ♪



Nunca tinha visto a linha pontilhada do pensamento dele ferver tanto quanto quando ele contava seus planos de alugar um apartamento, de três cômodos, e rachar o barato aluguel com você, sua gorda. De como ele procurava falar da maneira mais masculina o quanto ia ser divertido em te ajudar a lavar a louça, secar os copos, guardar os talheres e alguns outros serviços do dia-a-dia, que um dia viraria rotina. Por amor eu vi um filho mimado não se importar em sair do protetor colo de mãe e do aconchego dos remédios caseiros da vovó. Vi esse cabeçudo trocar as roupas passadas e bem guardadas, por mãos que sabiam apontar a melhor direção, em troca de alguns carinhos, bilhetinhos grudados em imãs de geladeira, comida queimada e o melhor encaixe de concha, feito lego. Vi ele trocar de atmosfera, vi o peixe tentar respirar fora d'água. E valeu a pena, pois qualquer um via que ele estava mais interessado em plantar uma nova família do que continuar colhendo frutos descascados e prontos para comer de sobremesa, feitos pela mamãe, da família que ele já fazia parte. E de repente eu vi alguém onipotente tornando-se frágil e vulnerável, tocando músicas com refrões melosos e repetitivos, implorando de volta um amor que foi e talvez não volte mais. De repente seu coração batia fora do seu peito. Seu coração andava por aí dirigindo um carro branco, tinha cabelos loiros e uma séria briga com as balanças que decoravam entradas de algumas farmácias. Um péssimo gosto pra tatuagens e um enorme carinho com seus cunhados. Seu coração tinha um vocabulário cheios de guloseimas, alguns beijos em pontas de narizes e um sério jurar de dedinhos que enforcava, por si só, toda dúvida contrária à verdade. O entrelaçar dos dedos mínimos era o jeito mais sincero e bobo de dizer que cumpriria aquela promessa, custe o que custar. 
Meses depois [...]

"Em caso de saudade, quebre o vidro." 

Acho que todo dia ele sangra tentando juntar os pequenos pedaços de vidro avermelhados do chão, uma medida desesperada e corajosa. Isso tudo para tentar restaurar e colar, pedaço por pedaço, um coração que ele mesmo partiu. 

Mas como negar esse amor se até no final do nome dela, tem um comecinho dele?



Para: Rafael & Mayra.


ps: Durante todo o texto, escutei apenas uma música;  Maria Gadú - João de Barro

quarta-feira, 15 de maio de 2013

Querida, III





15 de Maio de 2013.
Querida,

Eu sempre imaginei que acabaria ao lado de uma ruiva sorridente cheia de dentes, com sardas em abundância esparramadas em pequenos fragmentos por toda maça do rosto, feito pingos de tinta laranja-escuro em um papel branco e macio, perfurado por dois olhos azuis pálidos e cativantes, porém, sem emoção. Amiga da balança e com uma áurea de paz que te deixaria mais leve ainda, feito um sopro do vento acariciando uma cortina branca que moldurava um quarto pintado a mão por um casal de apaixonados, numa tarde chuvosa de uma quarta-feira de cinzas. Uma mulher imperfeita e comum, com duas ou três tímidas varizes nas pernas, algumas estrias em suas curvas e que tenha horror a esmalte borrado ou pontas duplas no cabelo. Uma garota simples e diferente, com calças bocas de sino, alguns shorts largos, penas como brinco e que adora as manhãs de segundas-feiras. Apaixonada por livros de romance e com algum interesse pela história; o mínimo possível, pois eu sei que não tenho saco para discutir sobre o por que dos alemães, um povo com tanta cultura e com uma nata intelectual avançada para sua época, se deixarem levar por um lunático carente, vegetariano, com um bigode tosto e o cabelo feio, penteado pro lado contrário da moda, a convencer tanta gente fazer um genocídio e seduzir a si próprio à lutar por uma pátria que nunca foi o seu berço. Uma sardenta sem grandes ídolos e com uma queda saudável por maconha. Uma garota sem doutrinas ou religiões. Que goste da natureza e que seja boa com os animais. Com algumas tatuagens de flores brotando do calcanhar esquerdo e se deixando morrer nas costas, com cores primárias delicadas e exóticas, e alguma outra em aramaico, arrodeando algum dos braços perto do cotovelo. Sempre desejei alguém que odiasse futebol e preferisse os desenhos de uma manhã sonolenta à assistir o noticiário da noite, sempre catastrófico e triste. Um vulcão com aqueles cabelos de ferrugem vivo, meiga no abraço de rua e decidida andando por aí com os dedos mindinhos entrelaçados, num sinal que estão juntos. Um flerte por música, algumas transas desajeitadas e perigosas. Cheia de cócegas, assim que trisco na sua pele azeda eu vejo enrijecer, com pressa, cada poro do seu corpo magro. Dona de alguns pelos pubianos cor-de-cobre que serão acariciados por uma barba, negra, por fazer, quando eu fosse te beijar nos teus lábios mais íntimos.

Querida, mas a verdade é que sempre fui eclético pra esse negócio de mulher. A minha vaidade e preferencia se dissipam diante de um bom caráter, um lindo par de seios, algumas verdades gordas e um sorriso bem dengoso. Qualquer garota pode ser a minha ruiva, basta ter uma postura feminina sincera e que tenha um magnetismo encantador para me seduzir a orbitar na volta do seu umbigo.

Araújo, Rodrigo.

sábado, 11 de maio de 2013

Sem teto, sem chão.



E eu não entendo essa minha mania de bater em portas que insistem em permanecer trancadas. E por mais que eu troque de endereço, o destino me joga exatamente em outra morada sem o sossego de um teto. É como se eu enviasse cartas para um CEP inexistente, não existe destinatário para o meu amor. Quando eu penso que aquele é exatamente o abrigo que por tanto tempo esperei, mais um teto insiste em desmoronar sobre minha cabeça e destruir tudo que coloquei em jogo, argamassa e cimento. Talvez se eu tivesse um alicerce mais forte não veria minha alma pedindo ajuda em meio aos sufocados e aos escombros do dia-a-dia. Mas ainda anseio pelo dia que encontrarei não uma morada, mas um lar. Um lar aconchegante onde eu possa mergulhar minha cabeça tranquilamente e dormir com a certeza de que de baixo daquele teto estou protegida das goteiras de malícia e de mentiras que chove aos montes lá fora. Porque eu tenho certeza que cada um tem seu teto para confortar e, eu tenho fé, comigo não vai ser diferente.


Por:  Soares, Tiessa & Araújo, Rodrigo. 

Desenho desanimado.




O controle remoto era pisoteado rapidamente por dedos infantis e o garoto procurava um canal de acordo com a idade apropriada para ele. O rapazinho tinha apenas doze anos e era apaixonado por desenhos animados. A bochecha suja de iogurte e uma euforia sadia, aquelas que só se encontra na época da juventude. De repente o pai do garoto disse bravamente:

- Seu filho-da-puta! Você passa o dia inteiro na frente da televisão, assistindo essas merdas repetidas! O que você quer pra sua vida? Vá estudar, vá ler um livro! Contas atrasadas, sem dinheiro. Moramos em um barraco de aluguel e você nessa sua vidinha onde tudo é bonito? Acorda pra vida, seu escroto!

O garoto assustado não respondeu, apenas abaixou a cabeça para poder diminuir o comprimento daquele solo de pagação de sapo, onde quanto menos ele falasse, mais curto seria o sermão.

E o pai continuou:

- O que você aprende com essa besteira toda?

O inocente garoto disse, com gentileza, a seguinte frase:

- Pai, você só ver o lado mau dos acontecimentos. Todos nós temos saúde mas o senhor só vê isso como uma oportunidade para ficarmos doente. Nós somos felizes mas o senhor só vê isso como uma oportunidade para ficarmos tristes.

O pai refletiu durante alguns instantes.

E o garoto finalizou:

- O que eu aprendo com essa besteira de assistir desenho o dia inteiro? Eu aprendi que os personagens só caem quando eles olham para baixo.

E o pai não disse mais nada.

segunda-feira, 6 de maio de 2013

O mais sábio dos seres




Gigantes cortavam as lenhas, organizavam e empilhavam as madeiras uma sobre a outra, preparando a fogueira que iria derramar um pouco de luz na volumosa noite que aos poucos ia se tornando cada vez mais evidente com a despedida do deus Apolo, o senhor do sol. Bruxos, magos e alguns feiticeiros acendiam magicamente o fogo para a reunião que seria banhada pela lua cheia e beijada por ventos fortes vindos do sul. Centauros vigiavam o perímetro, guardavam a segurança de todos ali presentes, e duas raríssimas fênix voavam alto riscando o escuro do céu como duas estrela-cadentes. Filhotes de quimeras corriam com suas patas de leão e voavam com suas asas de dragão derrubando um pouco de vinho e sangue, e as vezes assustando tímidos unicórnios que estavam ali presentes. Labaredas cuspiam pequenas chamas pelos ares e as vezes dava para ouvir pequenos barulhos que brotavam dos estalados das folhas secas que queimavam dentro do fogaréu. Todos aguardavam ansiosos o mais sábio dos seres chegar, inclusive O todo poderoso Zeus. Todos ali sabiam que seus ensinamento eram lendários, atravessavam gerações. Houve algum barulho no riacho e todos viraram-se para olhar. De repente um velho índio da aldeia disfarçou uma das mãos em forma de concha e mergulhou no rio, colhendo a maior quantidade de água possível para saciar sua devastadora sede. Seus cabelos longos e brancos gritavam sua gorda idade. Suas tatuagens contavam sua história em cada linha abstrata e suas cicatrizes lembrava todas suas batalhas espirituais. Ele mergulhava cada vez mais na claridade conforme seguia de encontro com a fogueira. Todos esperavam ouvir seus ensinamentos, sempre querendo aprender com o mais inteligente e temido dos seres. O silêncio reinava. O velho índio limpou a gargante e começou a falar:

- [...]

O líder dos seres falava, pois o que preserva a natureza é o mais sábio deles.

O receio de chorar.


de que vale o sorriso bonito, sendo que pode ser ambíguo?
gosto da lágrima, que é sincera e salgada,
se ver na dor, mas que também representa o amor,
não é forçado, é algo natural, vem de dentro..
limpa os olhos e purifica a alma.

Gosto das pessoas que choram, 
que não tem medo, que são verdadeiras, 
diferentes daquelas que sorriem, 
que podem forçar, que sabem enganar.

Qualquer um pode sorrir, 
na hora e do jeito que quiser,
é algo fácil e rápido.

Muitas pessoas, tem o receio de chorar,
de ver seu muro desabar,
porém, não sabem o quanto faz bem,
o quanto te deixa mais humano.

Geralmente é melhor se entregar ao mais normal,
ao mais aceitável, o que está no cotidiano.

Mas diferentemente, vejo a beleza no choro, 
porque de que vale um sorriso, sendo que pode ser ambíguo?
gosto da lágrima, que é sincera e salgada.



Por: Martins, Ulysses.

quinta-feira, 2 de maio de 2013

Capitães da própria embarcação.





Andando sozinho, caminhando ao infinito,
vendo a cada dia novas rotas para o mesmo destino,
pessoas, coisas, nos cruzam,
nos dizem, nos impõem, qual rumo seguir,
atalhos, paradas, qualquer tipo de jogada,
mas no final só querem nos confundir.

Somos capitães de nossa própria embarcação,
o mar é o nosso mundo e o vento o nosso guia,
soprando às oito direções, mudando todo dia.

Não há erros, nem viagem perdida,
tudo faz parte do aprendizado da vida.


Por: Martins, Ulysses.