quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

Quinta-feira à noite

O girassol me seguiu com seu olhar cor-de-piscina. Seus cabelos queimados pela genética estavam amarrados em rabo de cavalo e senti um leve perfume de condicionador brotar deles quando cheguei perto. No abraço, eu senti você inspirar e roubar o resto do perfume em meu pescoço e, quando expirou, senti seu hálito loiro embalsamar o ambiente e inundar de flores o meu jardim. Brinquei com sua idade mas eu sei a cor do brilho de seus olhos, e isso é o que vai importar quando o tempo lhe trouxer rugas em volta do seu olhar. Durante a escuridão da noite, eu fui seu sol durante 20 minutos e fiquei feliz por você girar em torno de mim sem ter a ardência nos olhos. Durante 20 minutos mergulhei fundo no seu olhar desejando me afogar para, quem sabe, ressuscitar com o boca-a-boca de seus beijos.

quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

Estrela cadente e mágica

Os últimos raios de sol se despediam, com pesar, do casal apaixonado fazendo deliciosos pecados e saliências em frente a uma igreja. Desdenhado o local em que enamoravam, o rapaz de sorriso malandreado tentava convencer sua donzela de que seus atos entusiasmados de carícia não lhes apontariam o dedo, não os julgariam, pois não estavam violando nenhuma lei celestial. Com um sorriso genuíno e com cabelos cheirando a lavanda, Epitáfio disse:

- Não se preocupe! O amor é um influente argumento a favor da misericórdia divina. Se o mundo acabasse hoje, seríamos arrebatados pela graça do nosso beijo, e pelo sorriso que damos, entre um e outro afago.

Enquanto Epitáfio dizia inúmeras desculpas para a convencer de continuar com o pequeno delito espiritual, ela o olhou bem no fundo dos olhos e pode perceber a parede da retina pintada com uma forte cor-de-pinho e um perfume doce saindo dos poros de seu pescoço. Ela ensurdeceu, estava submersa e seca, sonhando acordada. Michele sentiu o frio beijando sua nuca enquanto se arrupiava e praguejava silenciosamente por não ter uma blusa de frio por perto para esconder o enrijecer de seus mamilos rosados. Ela reparou nas luzes laranjadas brotando dos postes acessos, dando um tom sépio as palavras entusiasmadas que saiam em forma de saliva, o que geralmente acontecia quando ele estava eufórico ou excitado demais com algum assunto.

Um beijo inesperado a fez despertar. Ela notou as imperfeições nos dentes de Epitáfio e em sua língua que tinha um tom vermelho-limpo. Michele não tinha forças suficientes para policiar-se e apenas se deixou levar, os olhos cor-de-madeira de Epitáfio lhe roubou de novo toda sua atenção. Com o máximo esforço, Michelle tentou recuperar ao menos o mínimo de sua lucidez e reconheceu que o encarava por tempo demais, e sentiu o sangue se aglomerar nas maçãs de seu rosto. Estava ficando vermelha, ela pudia sentir brasas em sua face.

O que houve? - disse Epitáfio num tom mais amistoso que conseguiu emitir. - Você está com vergonha de mim, garota?

O simples fato de Epitáfio verbalizar o constrangimento escancarado no rosto de Michele, o fez ficar mais forte e mais intenso. Como se apenas pelo ato dele falar que ela é um pássaro, ela sentiria que poderia voar mais alto ainda. Suas palavras era mágicas, e ambos sabiam disso.

Como Epitáfio era mais alto que Michele, ele ficava na rua, um degrau abaixo do meio fio e de Michele, para assim nivelar a estatura de seus corpos. Michele sentiu o vexame lhe abraçar apertado e isso dificultou disfarçar sua timidez. Seu primeiro impulso foi de olhar para baixo, mas sentiu medo de cruzar olhares com seu amado. Então decidiu conferir o céu de poucas estrelas e poucas nuvens, esquivando-se do olhar hipnótico de Epitáfio.

Uma estrela-cadente ali! - Gritou, Michele, meio desajeitada. Seu dedo seguia a estrela conforme ela lentamente ia desaparecendo no céu escuro de Brasília. Michele apontou para a estrela sem medo algum de criar verrugas na ponta de seu dedo - Faça um pedido, Epí.

Ela disse isso mais por susto e alívio do que por vontade de conhecer os desejos mais profundos de Epitáfio. Sentiu o sangue escorrer por dentro de seu rosto, como se a estrela-cadente fosse uma borracha que tirou o vermelho de seu rosto.

Epitáfio seguiu com os olhos o clarão de luz, lembrando das juras feita com amigos de infância sobre o que pediriam caso algum deles encontrarem de fato uma lâmpada mágica ou algo que lhe dessem o direito de ser presenteados. Ele fechou seus olhos e deixou o coração falar. Limpou a gargantaa e disse:

- Não precisa, - sussurrou baixinho. - Estou me deliciando de cada pingo de saliva do seu beijo, estou usando como travesseiro cada nuvem do céu da sua boca. Nesse mundo onde a escassez de sentimento faz as pessoas ficarem desesperados para sentir algo, você me faz acreditar na exceção de ser um despretensioso que ama e é amado. Sei que posso levantar o seu vestido e me divertir com sua virilha antes de brincar com seu ventre. Também sei que posso me espreguiçar no seu colo, em baixo de uma nogueira, e brincar com seus cabelos antes que o sol se deite. Não tenho certeza do que eu gostaria de esmolar dos céus, pois eu sinto que já tenho. Você é meu feriado pessoal e eu deveria agradecer por você existir. Portanto não preciso pedir nada, pois o que eu não desejei, já está se realizando. Eu amo você, Mi.

Um ouvinte distraído não conseguiria enxergar o amor em suas palavras. Seus olhos amadeirados a hipnotizaram e ela gostou disso. Apesar de seu gestual malandro, ela pudia ouvir a verdade saindo entre os dentes divorciados de seu querido Epí. Ela só conseguiu amá-lo mais ainda. De repente seu amor por ele havia se multiplicado feito magia. Como eu disse, suas palavras eram mágicas.

domingo, 13 de janeiro de 2013

Querida, I



13 de Janeiro de 2013
Querida,

E eu desacreditei que em algum dia, ensolarado ou de chuva, você estaria lavando a enorme pilha de louça na cozinha da sua casa com aquela pose de dona de casa que pesa sua idade em uns três ou quatro anos a mais. Com seus cabelos presos em rabo-de-cavalo e ouvindo as canções avulsas da rádio AM que força você a cantar fora do tom com a mais desafinada das vozes. Enquanto cantarolava a música mais tocada do Cazuza - Codinome Beija-Flor - você, vez e outra, disfarçaria a esponja em forma de microfone e berrava alegremente aquela parte do refrão que você adora tanto, e assobiaria nas curtas partes não cantatas acompanhando o solo da guitarra. Então sua mãe iria girar grosseiramente o botão gordo e empoeirado o mais que se pode no sentido anti-horário, crente que abaixaria o volume para poder gritar mais alto contigo e deprimir o seu já triste serviço doméstico. Ela volveria o botão errado, corrupiaria o botão que determinaria a frequência das estações e isso faria a agulha da sua antiga radiola pousar no refrão de uma melodia de um grupo de pagode, o nosso hino. E de repente você teria a porra de uma epifania feminina. Como se seu amor fosse um interruptor e que você não clareasse os cômodos da minha paz não por falta de vontade, mas porque ainda estava procurando o maldito botão no meio de uma sala sombria, tateando no escuro tentando desesperadamente acender essa luz, essa luz no fim do túnel. E então eu veria você vir correndo de volta pro meu perfume doce, meus olhos claros e meu nariz grande. Dizendo que me ainda me ama e que adorou o fato de eu escrever sobre o nosso amor três vezes mais do que o protagonista daquele filme romântico que a gente assistiu, pela metade, pois sempre tínhamos um beijo ou uma transa que não poderia ficar pra depois. E ainda mais; que você admirou tanto por existir algo assim tão forte entre dois personagens da vida real. Eu finalmente desacreditei disso tudo.

Araujo, Rodrigo.

sábado, 12 de janeiro de 2013

I do, so what ?





Quem sabe eu serei um daqueles velhinhos com a cara simpática, que carrega o molho de chaves na saliência da calça, por onde passa o cinto, e as deixa cair suavemente no fundo do bolso traseiro. Sempre com um conselho na ponta da língua e algumas pratas no fundo do bolso. E quando as velas custem mais caro que o bolo, eu espero ter largas marcas de riso espalhadas pelo rosto já surrado pelo tempo, delineando assim uma vida de alegria e harmonia. Um daqueles velhinhos que tem a paciência de um pavio de vela queimando, a tranquilidade de um domingo a tarde. Tragando um cachimbo, contando histórias de terror em volta da fogueira pros amiguinhos de meus netos e netas. Então eu reclamaria e protestaria, como um bom idoso faria, que estou numa carcaça velha demais para um espírito tão jovem. Como a criança dentro de mim irá brincar de futebol, sendo que o receptáculo está caindo aos pedaços? Faria essa piada sem graça no lugar mais privilegiado da mesa de jantar, durante o natal onde a família estaria toda reunida. Todos iriam rir e eu agradeceria, em silêncio, por ter essa vida, com um sorriso no canto do rosto. Sem graça olharia para meus pés, depois para minhas mãos, enfim para meu dedo anelar esquerdo e veria aquela circunferência dourada perfeita, com a latitude e a longitude do nosso primeiro beijo gravados pelo lado de fora da aliança. Depois olharia para meu lado direto e lá estaria minha esposa com um rosto tão judiado pelas páginas do calendário e um sorriso, o mesmo sorriso de 31 anos atrás. O mesmo brilho dos olhos, a franja do cabelo pro mesmo lado de sempre. A mesma vergonha da nudez, o mesmo sentimento. Contaria de novo e outra vez a história do beijo com vontade que acabou com o aplique entre meus dedos, não foi nada romântico mas até hoje rende boas gargalhadas. O espelho denunciaria o prateado em meus cabelos arrumados na bagunça e o grisalho da minha barba por fazer. Também deletaria meus olhos cansados e minha alegria em viver, estampado em cada engelhado de minha fisionomia amigável. Olharia para trás, para minha juventude, apenas para balançar a cabeça, para cima e para baixo, afirmando minha escolhas, apreciando meus caminhos. Faria esse gesto aplaudindo em silencio, orgulhoso de mim mesmo.

sexta-feira, 11 de janeiro de 2013

A cura

Mãos suadas, borboletas no estômago, coração acelerado. Essa doença faz você apontar um lápis e escrever um poema gigante sobre o vestido amarelo e florido que ela sempre usa para reler seu livro predileto no parque da cidade aos finais de semana. Te faz escrever os detalhes; dizer algo sobre os  cabelos negros e brilhosos, presos por uma presilha da cor do seu vestuário, enquanto se delicia com a brisa de final de fevereiro, que corre suavemente entre as folhas, frutos e alcança seus óculos de leitura e seu rosto, secando o pingo de suor que se formava ligeiramente um pouco a cima de sua boca angelical e macia. Esse parasita, as vezes benigno, faria você expressar-se por manuscrito o quanto admira o fato do mundo pular carnaval enquanto ela relaxa sentada no frescor da sombra de um nogueira bem alta, em pleno verão tropical do hemisfério sul. Reler mensagens, ligações embriagadas na madrugada, escrever o nome dela no box do banheiro durante o banho quente. Outro prognóstico para essa cruel infecção seria o rapaz escrever músicas que fala sobre o jeito como ela levanta um dos pés no clímax e no final do beijo, como uma assinatura, como uma rubrica. Compor e musicar como é incrível o fato do corpo dela se enrijecer quando ela põe o pé descalço no chão frio, como ela se abraça e esfrega seu próprio corpo para espantar o frescor gélido indesejado. Esse câncer te obriga a gravar um CD com canções para épocas menstruais, comprar um sorvete e passar a tarde inteira alisando a barriga dela para aliviar suas cólicas. Faz você a não acreditar que seja real, faz você pedir um beliscão a cada noite de amor com óleos sensuais e músicas de fundo. Tá na cara que essa enfermidade se chama paixão. Todo mundo consegue diagnosticar um sintoma de amor, mas será que alguém tem o remédio para curar esse mal?

quinta-feira, 10 de janeiro de 2013

Who knows?

Quem sabe nem o Alzheimer me faça esquecer o período menstrual da menina com o andar engraçado que tem tanto medo de sapo. O gingado espontâneo dela cativou meu sexo e durante um bom tempo minhas fornicações foram todas dedicadas a auréola enrijecida do seio dela. Quem sabe meu filme pornô seja ela. Quem sabe a princesa cansou de ser acordada com um beijo na boca de um príncipe clichê e sem graça, quem sabe ela queria mesmo é uma boa chupada entre as pernas, um linguete matinal. Quem sabe ela queira acordar sem saber se ainda está sonhando bem alto, lá nas nuvens. Quem sabe eu emolduraria as calcinhas que roubei após o sexo com amigas que conhecia tão bem. Não lavaria e não nomearia, deixaria o odor falar por si. O cheiro seria a assinatura invisível de uma noite fedida a fornicação e a sexo sem compromisso. O amor tinha prazo de validade, ele só existia durante aquela hora incompleta de uma noite escura e cinza de um dia frio, dentro de um hotel com letras em azul e vermelho piscando lá fora. Quem sabe liberdade seja colocar o necessário na mochila e andar por aí. Conhecer cachoeiras, mulheres e mergulhar de ponta na duas. Relaxar na beirada, fumar, acampar e passar a noite inteira ouvindo seu barulho de acalento e violência. Quem sabe liberdade esteja no céu da boca de quem te acorda fazendo um boquete enquanto os primeiros raios de sol iluminam as marquinhas queimadas de um biquini fio-dental. Quem sabe o tom amarelado do seu dente não seja pelo cigarro ou pelo café excessivo. O tom avermelhado da sua gengiva pode significar que você passou a tarde inteira comendo amora, açaí ou lambendo uma garota menstruada. Quem sabe o óbvio é inimiga da descoberta e aliada de uma imaginação fértil e podre, feito terra preta. Quem sabe dedicação seja passar em todas as matérias escolares, ou talvez seja uma frase de efeito de alguma loja que pagou caro por um tempo no horário nobre da televisão. Envolvimento com desleixo nunca convenceu ninguém a batalhar grandes guerras, envolver-se não é o prato principal de alguma refeição, no máximo é a cereja do bolo no qual o primeiro pedaço vai para a pessoa que mais se comprometeu e se esforçou para estar ao seu lado. Quem sabe comprometimento não seja a galinha e seus ovos, e sim o porco, o bacon e seu sangue ainda morno.

segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

3,9 km



A uma velocidade razoavelmente baixa eu ia trotando suavemente, ao mesmo tempo meu cérebro discutia, recordava e analisava minha vida inteira numa velocidade incalculavelmente alta, incrivelmente rápido. Meus pensamentos iam se organizando a medida que a batata da perna começava a doer e o suor a descer. Minha meditação amortecia o impacto no solo desgastado pela chuva, minha filosofia estava fazendo o papel do meu tênis inapropriado para uma corrida, meu pensar me fazia andar em nuvens. Sentir o corpo pedir calma é a mesma sensação de lamber uma pilha; Ao mesmo tempo que te faz sorrir de cocegas, te faz arrupiar de angústia. Minha dependência psicológica do cigarro fazia minha mente criar uma fantasia utópica, ela criava alguma tragédia para meu corpo poder se deleitar com uns bons tragos do cigarro. E o devaneio dos meus poros faziam uma ilusão, ele inventava uma comemoração para eu poder beber uma cerveja bem gelada, descontraidamente, com os amigos. Mas o zelo do corpo inspira desintoxicação dos costumes. Estou 'desobvializando' minha rotina, meus caprichos. Quero mobiliar minhas idéias, não quero ser uma cara de pergaminho perfurada por dois olhos verdes sem emoção, quero evoluir e revolucionar, ao menos pra dentro da minha cabeça, no porão do meu senso. Não tive sequer algum hematoma, minha consciência degladiou pacificamente e derrotou os pesares do baixo-astral, vencendo e erguendo a bandeira branca; não de vitória, mas de conquista! Diminui o passo; terceira, segunda, primeira, finalmente o ponto morto. Meus pensamentos já não gritavam comigo e eu pude ouvir os batimentos do meu coração. Estava tão forte que a camisa fazia movimentos ligeiramente rápidos, subindo e descendo. Meus batimentos se enxergavam a olho nu!  Vários pensamentos e 3.900 metros depois, eu sentei e fiz uma prece rápida agradecendo mais um dia de vida, mais um dia de conflitos internos transformados em paz externa, mais um dia de guerra espiritual convertidos em harmonia pessoal, mais um dia de ódio singular metamorfoseado em amor coletivo.

domingo, 6 de janeiro de 2013

Welcome 2013

Irei arrancar, na pinça, todo pelo impuro e sujo do meu próprio corpo para que este ano eu esteja imune a toda imundice passada. Vou parar de tragar a morte e soprar a vida pro alto, também vou parar de beber esse veneno delicioso. Irei continuar amando sem condições; amar se, quando ou porque. Em 2013 não vou ler horóscopos ou jogar búzios na tentativa desesperada e tola de saber meu futuro, vou apenas deixar rolar e ter a consciência de que só vou colher o que eu plantar. Este ano eu vou ceifar a vida e morrer com ela. Nesse ano de 2013 eu quero consertar minha arcária dentária e fazer muitos filtros do sonho, quero mobiliar meu quarto e revelar mais fotos. Prometo ir no parque da cidade e distribuir flores amarelas. Em 2013 eu quero reatar com essa moça de cabelo liso e de rosto embriagado, mas agradável de se olhar e se perder. Quero correr, malhar e gravar muitos outros vídeos pornô. Quero errar, perdoar, respeitar e admirar. Nesse ano eu quero ir todo domingo na missa, que fica numa igreja de frente pro lado, encostado numa bela árvore e ver o pôr-do-sol. Quero mergulhar no meu emprego, mas sem me afogar. Não tenho grande ambições; continuo querendo a paz e a harmonia, sou como um cachorro perseguindo o próprio rabo, não sei o que fazer quando eu finalmente conseguir. Não tenho grandes depressões; um suco de uva e um pacote de biscoito, que com certeza vou dividir com as companhias certas, já farão meu dia feliz, não preciso de psicólogos ou tarjas pretas para consertar o inquebrável ou entender o inexplicável. Que 2013 seja apenas mais uma velinha que apagarei felizmente nesse bolo da vida.