quarta-feira, 30 de março de 2016

Querida Karen, XVII





Março, 30 de março de 2015.
são 22:12 e estou sóbrio.

Querida Karen,

Desde que você nasceu, o planeta terra completou, pela vigésima quarta vez, uma volta ao redor do sol e, por incrível que pareça, o mérito é todo seu. Parabéns. Hoje, ao falar com você pelo telefone, me lembrei de toda aquela bobagem pretensiosa que aconteceu quando me apaixonei por você. Quando eu desenvolvi, aos poucos, aquela loucura saudável que me fez acreditar que você era a mulher da minha vida, que você era a pessoa ideal, a tempestade perfeita. Sempre procurando algum hábito ou mania boba - que geralmente seria motivo de uma separação justificável -, para tentar convencer, a mim mesmo, o motivo de eu estar ali. Mas não precisava. Eu tentava proteger esse sentimento - ou loucura - assim como um fumante o faz ao acender seu cigarro sem vento algum; o instinto fala mais alto e a mão, agora em forma de concha, te impedia que você pegasse carona e voasse, mesmo sem existir o sopro que apagasse meu vício procrastinador da vida. 

Mas hoje foi diferente. Depois de sete anos, dezessete textos e vários romances desajeitados e atrapalhados por essa minha mania de não me sentir tão disponível assim, acho que alguma coisa mudou. Você me falou um pouco sobre o homem que agora faz parte da sua vida. E eu te falei, pela primeira vez, sobre uma garota, uma menina que gosta de usar calcinhas grandes, uma mulher que já não faz parte da minha vida. Combinamos de trocar convites de casamento; prometi que iria ao seu, e que você não deixaria de aparecer no meu. Karen, sinto muito pela sua avó. E o que eu disse ainda vale, viu? Eu posso te emprestar a minha de vez em quando. Diz pra sua mãe se cuidar, pensei tanto nela hoje. Disse também pra você me ligar sempre que sentir vontade. Você não me disse muito sobre seu filho, mas espero que esteja saudável, sapeca e, como você mesma diz, sorrindo com o olhar. Algo mudou. Demorado. Gentil. Natural. Ainda amo você, mas agora é diferente, é exatamente como ...

- Hank, ainda está aí? - você disse ao telefone.

E sua voz me trouxe de volta à realidade, Karen. O doce sopro que percorreu como áudio, foi codificado em ondas de rádio, transportada e, só então, descodificada. Incrível.

- Karen, eu acho que não.



Unfaithfully yours,
Hank