segunda-feira, 17 de março de 2014

Forgive me, Father. IV



A moça que entrou no confessionário tinha uma marca de sol do dedo anelar esquerdo e um olhar condescendente no rosto. Ela tolerava o mundo, suportava o renascer da sua própria alma depois de um divórcio premeditado - e tudo o que ela precisava era um pouco de compreensão.

- Padre, perdoe-me pois eu pequei.

- Pois não, minha filha. Em que posso ajudar?

-  Larguei o meu marido faz 3 meses, e agora eu sou independente. Estou atrás do meu orgulho como mulher. Jamais me casarei novamente!

- Não me diga...

- Como assim?!

- Separações. Eu fico um pouco triste, entende? Afinal eu casei a cidade inteira... Inclusive você e seu ex-marido.

- O senhor não teria um padre, ou bispo, para poder se confessar e contar suas próprias tristezas? Não posso absolver o senhor, padre.

- Desculpe, perdi o foco. Continue...

Ela organizou os pensamentos sem saber o que dizer.

- Mulheres divorciadas - disse o padre. - me fazem ter um tipo de honestidade sexual aflorada. Até hoje não sei por que. Mas me diga, minha filha...

- Pode me chamar de viúva - ela disse em um tom amargo, interrompendo o padre. -, pois aquele verme morreu para mim!

- Não me diga...

- Como disse?!

- O que você procura, moça?

- O amor-próprio.

- Não posso te ajudar - disse o padre -, aqui nós ensinamos a compartilhar o amor, não a escondê-lo só para si mesma. Você está associando o sagrado e hipócrita laço do matrimônio com a miserável oportunidade de ser infeliz para o resto de sua vida. O casamento devia ser um rótulo para a felicidade, e não uma mola propulsora pra a liberdade do divórcio.

- Não acho que me amar seja pecado, padre.

- E não é. Você desacreditou do amor compartilhado, dividido. O mundo não precisa disso. O amor-próprio é revolucionário, motivador e poético, mas com certeza não é a resposta. É bastante contemporâneo, mas amar a si mesmo, e somente a si mesmo, é fuga de ser o que você nasceu pra fazer: amar o próximo.

- Por quê? - perguntou a moça, como se ele não tivesse uma resposta satisfatória que justificaria sua ideia anterior.

- Porque amar a si mesmo, e fazer disso a sua motivação de vida, é como fazer cócegas à si mesmo; não tem a menor graça. 

Ela passeou, de leve, com a ponta do dedo indicador direito em cima da marca de sol que a aliança deixou, e refletiu por alguns instantes sobre as gargalhadas que deixará de dar seguindo esse caminho tão solitário.

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